"Quem não ouve a PGE quebra a cara", diz procurador-geral
O novo procurador-geral do estado, Paulo Moreno, que assumiu em janeiro para
uma gestão de quatro anos, diz que o gestor público tem procurado cada vez mais
a PGE antes de firmar contratos e realizar licitações. O objetivo é evitar
problemas como o que ocorreu com o contrato da Secretaria de Desenvolvimento
Urbano com o Instituto Brasil.
As secretarias e órgãos estaduais precisam de parecer da Procuradoria para
firmar qualquer tipo de contrato, em licitações de compra de materiais,
contratação de empresas e outros?
Todos os editais e contratos têm que ser submetidos à Procuradoria, que tem
feito nos últimos anos, em casos mais usuais - onde você possa criar certos
condicionantes prévios - amarrar mais algumas situações: temos feito
editais-padrão. Quando se padroniza geralmente são editais mais simples, para
aquisição de materiais de escritório, por exemplo, ou pequenos serviços, até um
certo valor. Em contratos de valor maior, qualquer procedimento tem sido
acompanhado pela Procuradoria. E mais: nos contratos de grande porte a
Procuradoria não apenas analisa o processo, acompanha os procedimentos desde o
início. Isso ocorreu, por exemplo, no contrato do metrô de Salvador e todo o
processo de transferência para o Estado. Ou seja, a Procuradoria-Geral do Estado
é a regra a ser consultada e ouvida para todas as questões de ordem jurídica.
Há quanto tempo o senhor está na Procuradoria?
Tenho vinte anos de procurador de Estado e já fui chefe da Procuradoria de
Licitações e Contratos, procurador-chefe da Procuradoria Administrativa. Através
da uma consulta interna entre os colegas fiquei em primeiro lugar para o cargo
de Procurador-Geral.
É comum um gestor não atender ao que a PGE orienta?
Não é comum acontecer, porque os gestores se sentem muito mais confortáveis
quando atendem o que a Procuradoria recomenda. Mas a Procuradoria só recomenda.
O parecer não vincula a atuação do gestor, que pode contrariar esse parecer,
mas, obviamente, vai responder por isso.
Vai quebrar a cara?
Mais ou menos isso...
Isso ocorreu com a Secretaria de Desenvolvimento Urbano do Estado (durante a
gestão do secretário Afonso Florence, hoje deputado federal do PT) no contrato
com o Instituto Brasil, quando a pasta não atendeu ao parecer da PGE contrário
ao contrato.
E tem uma outra questão que, às vezes, gera alguma confusão. Uma coisa é um
parece antes do contrato outra coisa é a execução. Na execução não temos, via de
regra, nenhum tipo de atuação. Só atuamos na execução quando somos consultados
por alguma questão de interpretação na execução ou quando surge algum vício.
Depois que o caso estourou e se descobriu um desvio de R$ 6 milhões nesse
contrato, salvo engano era a PGE que teria a função de tentar recuperar,
ressarcir esses recursos...
Quando acontece algum desvio, pode ser esse ou outro contrato, não falo
especificamente desse (Instituto Brasil), cabe à Procuradoria analisar a punição
administrativa à empresa, à fundação, enfim, e também aos servidores
(envolvidos). E, se for o caso, ingressar na Justiça para cobrar esses valores.
O caso do Instituto Brasil serviu para a Procuradoria e os órgãos de controle do
Estado aprimorarem seus procedimentos de fiscalização de contratos?
Não posso antecipar efetivamente se a execução (desse contrato) gerou esses
prejuízos. Isso é algo que, me parece, está sendo ainda investigado. Mas, de um
modo geral, toda situação da execução que a gente depara que houve alguma
inconsistência, alguma fragilidade, isso serve para que a gente possa
aperfeiçoar nosso controle.
A nova Lei Anticorrupção vai ajudar o trabalho da PGE?
Com certeza. Todo o procedimento que visa coibir desvios é muito bem vindo. O
que a Procuradoria tem que ter em mente também é que não se pode ter uma
politica de achar que todo empresário é desonesto, nem todo servidor possui
problema de irregularidade funcional. Isso é uma minoria, mas infelizmente a
capacidade de fazer dano é grande. O Estado da Bahia toma muito cuidado,
consulta muito a PGE. Nos últimos anos isso tem se acentuado, embora sempre
tenha sido uma característica da Bahia. Cada vez mais os governantes tem a
preocupação de consultar a PGE. Precisamos sempre encontrar uma saída jurídica.
Por exemplo, é preciso construir um hospital, uma delegacia de polícia, um
projeto importante que não se pode simplesmente dizer sim ou não. É preciso
criar uma alternativa jurídica que possa dar confiança ao gestor para que ele
toque aquele projeto. Na medida que a PGE participa da gestão, a gestão se
fortalece, se torna mais transparente.
Essa procura do gestor pela PGE aumentou com os escândalos de corrupção?
Isso já é um fenômeno de um pouco antes desses escândalos. A PGE obteve um
financiamento do BNDES que só é liberado para entidades de cuidam de gestão
pública. Foi o primeiro empréstimo do BNDES para um ente de natureza jurídica
por entender exatamente que o órgão jurídico não é apenas para dizer sim ou não,
mas que tem a função de construir alternativas.
Qual o maior problema que o Estado enfrenta nessa área de contratos?
Sempre acho que o grande problema não só da Bahia, mas do Estado brasileiro é a
fiscalização na execução (dos contratos). É onde o Estado brasileiro precisa
investir mais. Os instrumentos jurídicos, em alguns casos, são até muitos
rígidos, mas o problema é do controle dos atos.
O que dá mais trabalho à PGE?
O excesso de ações judiciais contra o Estado. Muitas vezes são ações fundadas,
mas há muitas infundadas. É preciso de uma consertação pública com outros
órgãos.
Quais o senhor considera que causam mais problemas?
São os excessos de ação na área de saúde. Algumas até a gente reconhece e tenta
corrigir imediatamente. Por exemplo, a questão dos medicamentos de alto custo e
de próteses. Essas ações somam, seguramente, mais de R$ 75 milhões por ano. E o
orçamento não é elástico, pois precisa cuidar da situação de forma universal.
Algumas vezes há exagero, como nos casos de remédios que sequer estão na lista
da Anvisa ou que tem similares. Mesmo assim a gente recebe muitas liminares para
que sejam adquiridos imediatamente. A orientação da PGE é para que se cumpra e
depois recorremos contra as que achamos abusivas. Queremos criar uma câmara de
conciliação nessa área de litígio de saúde para atender melhor a população e
evitar essa quantidade de ações judiciais. Também cabe a nos, o Estado, criar
mecanismo mais ágeis para atender.
Como a PGE está tratando o caso da URV dos servidores que dizem ter ganhado no
Supremo Tribunal Federal?
São várias ações. Quando você vai executar algumas decisões existem situações
que precisam ser observadas. Pode ser que, em algum momento, haja prescrição,
que a pessoa não se enquadra na hipótese. Então, estamos analisando caso a caso.
A PGE tem a orientação de defender o Estado. Não concordamos com a tese (do
pagamento da URV) e em cima das decisões estamos analisando processo por
processo. O cumprimento depende de algumas questões jurídicas em cada um dos
processo. Se foi feito algum cálculo (sobre a dívida) eu desconheço.
A PGE tem a obrigação de defender o governador ou vice em algum processo?
Só se o ato decorrer de sua atividade no cargo.
No caso do vice-governador João Leão, citado na Operação Lava Jato?
Não. É uma discussão completamente estranha à atuação dele no cargo de
vice-governador.
Essa modernização da PGE, até em função do financiamento do BNDES, melhorou o
trabalho do órgão?
Muito. Alguns gestores indicavam que o grande gargalo da administração era a
Procuradoria, até de uma forma injusta. Hoje se vê pouca queixa. Nós agilizamos
muito o processo. Mas temos dificuldade de pessoal pela grande demanda. Para
você ter uma ideia, nós herdamos todas as cinco mil ações judiciais do Derba e
da Sucab. O governador está muito sensível para atender o pleito de novos
procuradores. Já temos um concurso que deveremos contratar mais 29 procuradores.
Nosso quadro hoje é formado por 218, mas o total é de 290. esses profissionais
analisam todos os processos do Estado. Só de processos eletrônicos temos 30 mil,
mas acredito que passe de 100 mil processos judiciais. A gente assina cerca de
80 ordens de cumprimento de liminar por dia. É um volume de trabalho
extraordinário. Hoje temos uma condição bem melhor de trabalho. Os governos de
Jaques Wagner e Rui Costa tem dado muito apoio à PGE.
Quanto tempo a PGE demora para dar um parecer sobre uma licitação?
Depende da complexidade da licitação. Se for um contrata de R$ 1 milhão para um
serviço de consultoria tem uma complexidade maior que se fosse para a compra de
material para escritório. Para a análise de um processo de licitação de
consultoria uma média de 10 a 20 dias. Mas isso depende. Pode chegar um caso
emergencial e ai é preciso parar o que está fazendo para resolver a prioridade.
Por isso não gosto muito de falar sobre prazos.
Nesse ano de crise econômica e pouco recursos o senhor acha que o governo vai
ter recursos para contratar novos procuradores?
Creio que sim inclusive porque o procurador cumpre o papel de fazer as execuções
fiscais. Então, ele arrecada também para o Estado, nas ações contra os
sonegadores. Claro que a gente prefere chamar para negociar. Fazemos isso aqui.
Fonte: Site A Tarde