Exit ou Remain? Nem um, nem outro. Como assim e por quê?

Quando o BREXIT retorna à pauta da comunidade europeia, face à efetivação da saída, já aprovada pelo Reino Unido, da União Europeia, torna-se útil analisar essa tormentosa questão, conquanto já decidida e em vias de cumprimento gradativo como previsto.

Há dois enfoques para esse dilema: um político e outro econômico.

O nacionalismo foi o móvel de todas as guerras europeias. Quanto a isso, os tratados de criação da UE e do MCE contribuíram para uma Europa única, de mais paz que em qualquer época da história moderna. Para isso foi necessária uma renúncia de parte da soberania dos Estados integrantes, em prol de ideais consentâneos com a igualdade dos povos europeus e da paz.

No âmbito econômico, a unidade da UE fez nascerem problemas, na medida em que se uniram economias díspares, com problemas sociais e fiscais que levaram os mais fortes a subsidiar os mais fracos, com prejuízos para uns países e vantagens para outros. No início tudo bem, mas ocorre que nem todos fizeram a lição de casa, com austeridade fiscal. A incapacidade das economias locais de sustentarem o estado de bem estar social em patamar elevado, o envelhecimento das populações e as demandas do consumismo moderno foram motivos que também levaram a evidenciar a incapacidade de se manter um sistema capaz de atender a todos, de forma equânime, seja no amparo previdenciário, seja em outros setores.

Os mercados dentro da UE, sujeitos a diversidade de fundamentos econômicos conjunturais e estruturais de cada um dos estados membros, começaram a sofrer os influxos das correntes migratórias de dentro da própria comunidade da UE. As crises da Grécia, Espanha e Portugal são os exemplos do primeiro fenômeno, tendo as economias mais pujantes do bloco (Alemanha, França, Reino Unido, Holanda e nórdicos) o ônus de subsidiar a quebradeira dos demais fragilizados.

Tudo ia mais ou menos suportável, sob os fluxos e refluxos da economia capitalista, enquanto a economia chinesa florescia, impulsionando os mercados globais, demandando produtos também das economias europeias. No momento, porém, em que o ciclo entrou numa fase de recessão, ou melhor, de reduzido crescimento, pois não se pode ainda falar em recessão em uma economia que mantém um índice de crescimento invejável como é a chinesa, mesmo no quadro atual da pandemia da COVID19, o nacionalismo -- esse gérmen da discórdia entre os povos -- aflorou, certamente inspirado no nosso aforismo "farinha pouca meu pirão primeiro".

O transbordamento do copo veio com a questão das correntes migratórias da África, Ásia e Oriente Médio, demandando espaços nos Estados da UE, sobretudo de muçulmanos, e também pelo advento do terrorismo do Estado Islâmico. Esses dois fatores mostraram a inépcia dos Estados participantes da UE quanto à segurança e controle de suas próprias fronteiras, além do surgimento de um terrorismo fanático islâmico, dentro dos seus próprios territórios, nascido nos bolsões de emigrantes e de nacionais convertidos, ou de origem religiosa islamita, que formam guetos de segregados sociais, com subempregos e carências de toda ordem, já que as sociedades autóctones desses países não foram capazes de integrá-los e eles próprios, por seus valores religiosos e culturais, formaram ilhas distanciadas (na minha última viagem a Paris vi uma quantidade enorme de camelôs e pedintes no Champs Elisées e em outros pontos, todos imigrantes das ex-colônias francesas, além de árabes e de outras origens do mundo periférico, fenômeno que não vi em minhas anteriores idas àquela metrópole!).

Como o terrorismo islâmico é suicida, não há parâmetro de contenção racional, o que assombra o utilitarista e materialista pensar ocidental, para o qual a morte é o limite da vida. Lembre-se que uma das causas dos terríveis ataques americanos a Hiroshima e Nagasaki, no final da 2ª Grande Guerra, foram os ataques suicidas da resistência japonesa, que desestabilizaram os parâmetros de temor do inimigo na guerra convencional. Isso aliado à intenção de testar a extensão da arma nuclear e para a determinação vanguardista e hegemônica do poderio atômico americano, em face do bloco comunista, até então aliado, mas depois potencial inimigo no cenário da Guerra Fria que se seguiu, até o fim da URSS.

A globalização, que transformou a terra em "mundo aldeia", contribuiu, pelo advento das tecnologias de comunicação, transporte, robótica e telemática, para disseminar em redes as questões tribais e culturais, antes distantes do cotidiano ocidental, não somente para dentro das salas e telas de tvs e smartphones, como para influir de forma sensível em todos os fatos da vida social do homem moderno, em qualquer quadrante do globo terrestre.

Então a BREXIT, a meu ver, é fruto desse conjunto de acontecimentos e representa para os que lutam por ela uma tentativa vã de retorno a um mundo ponderado, isolado e contido por guetos soberanos, que não têm mais razão para existir. Os mais jovens, até por intuição, perceberam, mais facilmente do que os mais velhos, essa realidade inexorável dos tempos atuais, daí o percentual de conservadores nas faixas etárias mais elevadas serem pela BREXIT, enquanto os mais jovens se posicionam pelo REMAIN.

Em suma, com o BREXIT já aprovado e em cumprimento, ou mesmo com o REMAIN por isso já afastado, o mundo vai continuar globalizadamente redutor das soberanias, em prol do regramento comunitário, mesmo em blocos ou até bilateralmente, como já está sucedendo, mediantes acordos pontuais e bilaterais do Reino Unido com países da UE, com toda sorte de "contaminação" com os problemas dos outros, pelo fato de que, “aos trancos e barrancos”, o ser humano há de chegar a um estágio de desenvolvimento em que os problemas de todos serão de todos.

Para isso devem ser banidos de vez o egocentrismo e as soluções "meia sola", que são alimentados pela divergência ideológica de esquerda versus direita, com suas saídas messiânicas irracionais e já testadas como desumanas e utópicas, para um problema que está na essência do homem, não importa o estágio das relações de produção, numa quadra ainda primitiva da história humana, em sua trajetória do porvir infinito.

Espero que uma horda de extraterrestres comece a invadir a terra, para nos ensinar que uma vida menos conflituosa é possível. Só assim nos uniríamos todos, primeiramente para derrotá-los, depois para entender com eles que não estamos sós no universo e que outra humanidade é possível.

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Paulo Borba Costa – Advogado – Ex-Professor da Faculdade de Direito da UCSAL – Ex- Conselheiro da OAB/BA e Ex-Membro do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/BA - Procurador do Estado da Bahia aposentado.

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