NOTA PÚBLICA: Reforma da Previdência (PEC n. 06/2019)
As entidades associativas abaixo subscritas, representativas dos mais
diversos segmentos do serviço público brasileiro, ao tempo em que reconhecem a
necessidade de ajustes e a possibilidade de aperfeiçoamentos no atual Regime
Geral de Previdência Social, como também nos respectivos regimes próprios, e que
louvam o esforço e o engenho dedicados pelo Governo Federal na elaboração da
Proposta de Emenda Constitucional n. 06/2019, apresentada ao Parlamento na
última quarta-feira, mas à vista dos excessos e dos equívocos por ela
veiculados, e que ainda podem ser corrigidos, vêm a público externar o seguinte.
1. A PEC n. 06/2019, da “nova” Reforma da Previdência, se aprovada nos seus
atuais termos, poderá prejudicar a própria sustentabilidade atual do sistema
nacional de Previdência Pública, na medida em que, tornando inviável a
permanência nos regimes atuais, veladamente direciona os segurados do RGPS e os
servidores dos RPPS (especialmente, na União, os que ingressaram entre 2003 s
2013) à migração para redes de previdência privada, basicamente geridas por
instituições financeiras e sujeitas às vicissitudes dos mercados . Se os
benefícios e serviços da Previdência Social reduzirem-se a produtos de mercado,
isentando o Estado do dever de assegurar o direito fundamental à previdência
social e de preservar a dignidade de aposentadorias e pensões, as consequências
para as atuais e futuras gerações serão danosas.
2. O art. 40, §1º, da CF, na redação do art. 1º da PEC n.06/19, promove uma
inadequada desconstitucionalização da previdência social brasileira,
configurando retrocesso nos âmbitos da proteção social e da segurança jurídica
dos cidadãos. Caso aprovado o texto em questão, haverá grave incerteza quanto ao
futuro das populações protegidas, cujas regras previdenciárias sujeitar-se-ão,
doravante, à vontade da lei infraconstitucional, sob quóruns parlamentares bem
inferiores àquele necessário para aprovar uma emenda constitucional.
3. Por sua vez, a instituição de regime obrigatório de capitalização individual
(art. 40, § 6º, da CF, na redação do art. 1º da PEC n. 06/19), em oposição ao
atual regime de repartição que inspira o sistema nacional de Previdência
Pública, tenderá a corroer o valor dos benefícios previdenciários no futuro,
reduzindo o poder aquisitivo dos segurados, e especialmente dos mais pobres.
Depreende-se que, a médio e longo prazos, será completamente extinto o sistema
constitucional de repartição, assim como o próprio resquício de solidariedade
que restou para os servidores que ingressaram a partir de outubro de 2013, na
medida em que se venha a suprimir as contribuições de governos e empresas para a
constituição dos fundos capitalizados de aposentadorias. Apenas servidores e
trabalhadores cotizar-se-ão, abolindo-se o centenário tripé de sustentação da
Previdência Social (patrão, trabalhador, governo).
4. De outra sorte, se a PEC da Previdência for aprovada nos moldes em que
proposta, haverá sensível redução da arrecadação previdenciária pela fuga dos
segurados da Previdência Social, dada a virtual inatingibilidade dos requisitos
para obtenção dos benefícios vitalícios, como a aposentadoria. No plano da
assistência social, idosos carentes, tendo entre 60 e 70 anos, poderão ter de
sobreviver com R$ 400,00 ao mês.
5. A PEC n. 06/19 não apresentou solução para problema do regime de transição em
prol dos servidores que ingressaram até 2003 e teriam direito à paridade e à
integralidade, sacrificando outra vez a segurança jurídica (face mais nítida de
um Estado de Direito) e desconhecendo a proteção da confiança que deve alcançar
aqueles que têm direitos em vias de aquisição. Não há previsão de regras de
transição aos que ingressaram antes de 2004, exigindo 65 anos de idade para
acesso ao benefício integral para homens e mulheres. Completar os requisitos um
dia depois da publicação da PEC n. 06/2019 poderá significar mais dez anos de
serviço para se aposentar com integralidade (sendo certo que, em todos esses
casos, os servidores terão contribuído sobre a totalidade de seus vencimentos,
durante todo o período de serviço público).
6. No custeio, a imposição de aumento injustificável na contribuição
previdenciária, com a instituição de alíquotas progressivas de servidores
públicos que podem chegar a 22%, preordena notória ofensa ao princípio da
vedação da utilização de qualquer tributo com efeito confiscatório (artigo 150,
VI, da CF), na medida em que a soma desse desconto com o do IRPF (27,5%)
aproximar-se-á ou superará a marca de 50% da totalidade dos vencimentos. Além
disso, a proposta joga a população contra os funcionários públicos, apostando na
redução pura e simples da renda alimentar dos servidores ativos e inativos,
enquanto segue poupando os verdadeiramente ricos, que vivem de dividendos.
Nascondições atuais, as alíquotas de 11% já implicam em respeito à capacidade
contributiva,
uma vez que aqueles que recebem rendimentos mensais acima do teto do RGPS
contribuem sobre uma base de cálculo maior do que aqueles que recebem abaixo do
teto.
7. Outrossim, a PEC n. 06/2019 ainda elimina o caráter público das fundações de
previdência complementar dos servidores públicos, além de facultar que os
respectivos fundos sejam integralmente geridos por entidades abertas de
previdência, mediante simples licitação, o que significa privatizar fundos,
gestão e meios, sem garantias para o servidor (inclusive para aqueles que, tendo
ingressado no serviço público antes de 2004, optaram por migrar para o regime de
previdência pública complementar, confiando nas balizas predispostas pela EC nº
41/2003).
8. Mudanças tão drásticas e draconianas configuram risco circunstancial de
agressão à Constituição Federal e fonte inesgotável de judicialização de
demandas. A Reforma da Previdência, como apresentada, joga para a população e
para os servidores públicos a responsabilidade pela má gestão do dinheiro
público, da corrupção, da sonegação fiscal e da dívida ativa da União. Traz
consigo o corte radical de gastos com comprometimento de direitos sociais, sem a
realização de um amplo debate com a sociedade civil e sem avaliar de forma
atenta as consequências de suas escolhas. Medidas restritivas e excessivamente
austeras gerarão aumento da desigualdade social e da pobreza, e não o contrário.
Assinam a presente nota:
Guilherme Guimarães Feliciano
Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho –
Anamatra e Coordenador da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério
Público – Frentas
Rudinei Marques
Presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado –
Fonacate
Fernando Marcelo Mendes
Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil - Ajufe
José Robalinho
Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República -ANPR
Jayme de Oliveira
Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB
Victor Hugo Palmeiro de Azevedo Neto
Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público – Conamp
Floriano Martins de Sá Neto
Presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do
Brasil– Anfip
Kleber Cabral
Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do
Brasil – Sindifisco
Petrus Elesbão
Presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e do TCU –
Sindilegis
Antônio Pereira Duarte
Presidente da Associação Nacional do Ministério Público Militar – ANMPM
Elisio Teixeira
Presidente da Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios
– AMPDFT
Marcos Fábio de Oliveira Nusdeo
Presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo – Apesp
Telmo Lemos Filho
Presidente da Associação Nacional dos Procuradores de Estado – Anape
Jordan Alisson Pereira
Presidente do Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central - Sinal
Bráulio Cerqueira
Secretário executivo do Sindicato Nacional dos Analistas e Técnicos de Finanças
e Controle – Unacon Sindical
Amarildo Vieira de Oliveira
Diretor-presidente da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público
Federal do Poder Judiciário -Funpresp-jud
Brasília, 22 de fevereiro de 2019.